Primeiro, vamos mostrar alguns trechos do Relatório da Comissão Processante que, de forma unânime, deu parecer favorável à cassação de Ezequiel.
Destaca-se:
“Os trabalhos da comissão se limitam à esfera administrativa e legislativa, não se confundindo com investigação criminal nem com processo judicial. Por essa razão, seus poderes instrutórios são restritos à produção de prova documental, testemunhal e coletada, tendo como escopo a proteção integral aos princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório, da motivação dos atos e da legalidade estrita, bem como do cumprimento do rito estabelecido pela legislação especial que trata a matéria. Por conseguinte, consta dos autos que o Vereador Ezequiel Vargas Rodrigues, no exercício de suas funções públicas de vereador, realizou publicações que violam princípios éticos e legais da atuação parlamentar. As denunciantes afirmam que as falas do parlamentar transcendem o posicionamento político, as quais atacaram diretamente diversas mulheres, mães, eleitoras, com ofensas ideológicas, transfóbicas e misóginas. E por tais fatos, o denunciado, em tese, teria praticado quebra de decoro parlamentar, afrontando seus deveres funcionais, sobretudo afrontando o princípio da moralidade administrativa, procedendo de modo incompatível com a dignidade da Câmara Legislativa, faltando ainda com o decoro na sua conduta pública, com base no artigo 7º do Decreto-Lei nº 201/1967, bem como no artigo 23 da Lei Orgânica do Município de Canoas e no artigo 37 da Constituição Federal.”
Segundo consta na denúncia, o vereador denunciado, no Dia das Mães, fez uma postagem em sua conta no “Instagram” sobre “13 mulheres esquerdistas que eu admiro”. E na sequência, um “carrossel” de fotos em branco. Tal postagem teria sido o estopim para desencadear outros comentários do edil, tais como: “tu é resenha hein hahahaha seríamos bons amigos. Mas só te respeito, não te admito, daí né, (risos).” “Olha, mulheres eu admiro. Imitações eu respeito, mas recuso.” “pra mim importa, mulher de esquerda militam pra matar bebê no ventre, tá doido. Eu hein.” “sugestão: me segue pra ver tudo o que tu me pede eu já faço. Veio tu e tua trupe comentar um monte de asneira aqui e nem me seguem, nem sabem o que eu faço. Por esse motivo não admiro pessoas de esquerda, por não buscarem o conhecimento e só falarem o que pedem!”
Na sequência das manifestações anteriores, o vereador realizou nova publicação em sua conta pessoal em rede social, desta vez por meio de vídeo, no formato de “story”, ferramenta comumente utilizada para veiculação de conteúdo efêmero com duração limitada (24 horas). No referido vídeo, o parlamentar aparece em ambiente informal, gravando a si próprio em primeira pessoa, utilizando tom coloquial e expressões populares. Durante a gravação, ele reafirma o conteúdo de sua publicação anterior e, em seguida, profere a seguinte declaração, de forma clara e audível: “Imagina admirar mulher que milita pra matar criança no ventre… pô, tá de sacanagem.” A fala do vereador, embora informal, carrega evidente julgamento de valor e conotação ofensiva direcionada, ainda que sem menção nominal, mas explícita a grupos ou posicionamentos políticos. O conteúdo foi tornado público sem qualquer restrição de acesso, possibilitando ampla repercussão e compartilhamento por terceiros. Ressalta-se que a linguagem utilizada denota sarcasmo e ironia, reforçando o teor pejorativo da manifestação e contribuindo para acirramento de ânimos e possível ofensa à dignidade de pessoas ou grupos que se identificam com a causa referida.”
No relatório ainda consta:
“O arquivamento do Boletim de Ocorrência ou mesmo a inexistência de processo criminal não impede a instauração ou continuidade de um processo político-administrativo pela Câmara Municipal. Isso porque as esferas administrativa, civil e penal são independentes, conforme reconhecido pela jurisprudência e pelo próprio ordenamento jurídico brasileiro. Os fatos podem ensejar responsabilizações distintas. O objetivo da Comissão Processante não é punir criminalmente o denunciado, mas sim avaliar a conduta político-administrativa, podendo culminar na cassação de mandato, caso configurada infração prevista no art. 4º do Decreto-Lei nº 201/67.”
Vale destacar também:
“Analisando o conjunto probatório, as manifestações atribuídas ao parlamentar envolvem: tom irônico sobre relações interpessoais e ideológicas; potencial conteúdo discriminatório em relação à identidade de gênero; generalização ideológica ofensiva contra mulheres de esquerda, associando-as à prática de aborto como forma de militância e desqualificação de opositores com base em convicções políticas, com tom agressivo e desrespeitoso. Tais manifestações violam os deveres ético-parlamentares, pois desrespeitam os princípios constitucionais da impessoalidade e urbanidade no exercício da função pública; promovem o descrédito à pluralidade de ideias, base do regime democrático; incompatíveis com a dignidade do cargo, pela linguagem inadequada e por reforçarem estigmas ou preconceitos. A imunidade parlamentar não protege manifestações incompatíveis com os deveres éticos e o decoro inerentes à função pública. Ainda, a liberdade de expressão parlamentar não é escudo para a propagação de discurso de ódio, ataques pessoais ou incitação antidemocrática. A jurisprudência do STF, portanto, é pacífica no sentido de que a garantia constitucional da imunidade parlamentar material somente incide no caso de as manifestações guardarem conexão com o desempenho da função legislativa ou que sejam proferidas em razão desta, não sendo possível utilizá-la como verdadeiro escudo protetivo da prática de quaisquer atividades.”
A CICS, que não possui nenhuma relação com o caso, opinou em nota sobre o assunto nos seguintes termos:
“A CICS Canoas acompanha com atenção e preocupação os recentes acontecimentos envolvendo a possível cassação do mandato de vereador. Em um momento delicado da vida democrática nacional, observa-se um cenário em que o exercício do mandato parlamentar, especialmente aquele voltado à fiscalização e à crítica do Poder Executivo, tem enfrentado restrições que comprometem sua plena autonomia. No caso em tela, as manifestações atribuídas ao vereador, ainda que controversas, foram proferidas em ambiente de rede social, dentro de um contexto de debate e provocação. Não há, até o momento, qualquer imputação de ato de corrupção, improbidade ou gestão temerária. Importa destacar que os mesmos fatos já foram objeto de apuração pela autoridade policial e resultaram em arquivamento. Independentemente de posicionamentos pessoais quanto ao conteúdo das declarações, o avanço de um processo de cassação por esse motivo representa um precedente sensível. A inviolabilidade parlamentar por opiniões e palavras, princípio consagrado na Constituição, visa justamente resguardar a liberdade de expressão no desempenho do mandato eletivo. Em um ambiente onde decisões relevantes para o futuro da cidade, como o reajuste de tributos, a prorrogação de concessões e a ampliação de estruturas administrativas, vêm sendo tomadas em ritmo acelerado, o pluralismo político e a presença de vozes fiscalizadoras são elementos indispensáveis à boa governança. A CICS Canoas reitera sua confiança nas instituições democráticas e manifesta sua expectativa de que o Legislativo municipal atue com equilíbrio, responsabilidade e respeito às garantias constitucionais. Recomendamos aos senhores vereadores que concentrem seus esforços na fiscalização eficaz dos atos do Executivo, na promoção de iniciativas voltadas ao desenvolvimento econômico e social de Canoas e na busca por soluções que fortaleçam a sustentabilidade fiscal do município. CICS CANOAS – Câmara de Indústria, Comércio e Serviços de Canoas.”
Na minha opinião, se torna lamentável a utilização da imunidade parlamentar como escudo para uma “impunidade para lamentar”.
A liberdade de expressão não pode ser confundida com “libertinagem de agressão”.
O Estado Democrático de Direito só é completo quando existe democracia, porém algumas pessoas parecem não saber o que isso significa. “Demos” significa povo e “cracia” significa poder. O povo só tem poder quando é respeitado pelos seus representantes. Uma pessoa eleita para um cargo tão importante não é representante de seus eleitores, de sua ideologia, dos seus preconceitos e traumas. Um representante do povo canoense deve se portar como tal, tem o dever de respeitar absolutamente todos os canoenses e, ao invés de promover a desunião, com discursos homofóbicos e de ódio, deve buscar apaziguar e conscientizar a todos sobre a importância do respeito à diversidade de opiniões e condutas. Não se trata de uma guerra ideológica, pois os vereadores que assinam o Relatório são do Progressistas, do PL e do NOVO, partidos que são da mesma corrente ideológica. Quando se verifica que não existe nenhuma voz dentro da Câmara de Vereadores saindo em defesa da conduta do vereador, parece que nenhum colega concorda com a forma como o vereador se porta no cargo.
Para a CICS de Canoas, pela nota emitida, parece que esse tipo de conduta representa o que eles consideram como conduta adequada para representar os canoenses.
Uma Resposta
E a medida protetiva de violência contra a mulher que o vereador juarez Hoy pq não abriram processo de cassação. Dois pesos e duas medidas ou os vereadores antigos possuem proteções ocultas.