Testo publicado em 9 de abril de 2009
Neste depoimento breve e simples quero explicar um pouco de minha ausência nestes últimos dias. Ocorre que estive muito atarefado com um trabalho longo e estafante, mas de grande satisfação pessoal. O bilhete que escrevo para vocês é uma espécie de quinto e décimo passo, um inventário pessoal relâmpago e também um relato que faço para Deus e para todos os leitores do Gratidão, que agora estou elegendo como padrinhos para ouvirem o que tenho a dizer a Ele. Saí da Fazenda Renascer há quase dois anos, no dia 13 de maio de 2005.
É isso mesmo, era dia da libertação dos escravos no Brasil. Foi o dia que realmente recebi minha ‘carta de alforria’ de adicto (escravo) e que dizia: “Nada e nem ninguém me fará usar drogas, se eu não quiser”! Fiz disto um lema em minha vida e planejei minha volta à sociedade com muita calma. Não me deixei engolir pela ansiedade e, principalmente, pela pressa em recuperar tudo que havia perdido rapidamente. Tenho andado com calma e gradualmente e minha vida tem se ajeitado.
Tenho a satisfação pessoal de saber que estou no caminho certo. Conquistei minha família de volta, minha filha volta a acreditar que tem um pai e um amigo, ganhei novos e verdadeiros amigos, tenho pessoas e grupos a quem recorrer quando enfrento problemas, gente que entende minha cabeça ainda confusa pelo longo período de adicção ativa.
E tenho que confessar que o que mais me faz feliz é ter de volta minha vida profissional. Esse último trabalho que peguei me deu a certeza que voltei, não pelo dinheiro que vou receber, até porque nem preço acertei com meu contratante. Mas pela dificuldade do trabalho e de saber que em momento algum tive que recorrer a substâncias para continuar, mesmo quando o cansaço era completamente dominante. Muito pelo contrário, ligava para o pessoal envolvido no projeto e avisava que precisava para algumas horas e eles entendiam.
É bom saber de tudo isso, mas é bom sempre estar refletindo e agradecendo. Sem isso posso cometer o mesmo erro de antes que é o de “viajar no sucesso”. Tenho que saber que uma vida em recuperação passa por algumas proibições, uma auto-vigia constante, principalmente na euforia, que para mim é o maior dos perigos. Sou deslumbrado e, se não me cuidar, isso pode me derrubar. Por isso peço que me critiquem, me dêem retornos construtivos. Elogios, também gosto, é claro, quem não gosta, mas eles são um perigo para um adicto e eu sei disso.
Voltei no jornal Gratidão e procurando e lendo textos que divido com todos é uma maneira de me manter em pé. Essa obrigação diária com quem lê ou recebe e não lê, me faz sentir na Fazenda Renascer, onde também havia os interessados e os desinteressados na caminhada de recuperação. Aqui na rua é a mesma coisa, recuperação é simples, mas não é fácil. Como pode um adicto compreender que tem que controlar sua alegria? Mas é assim mesmo, a felicidade não é momento, é continuidade e equilíbrio.
Procuro fazer isso e tem dado certo até hoje. O amanhã? Não sei. Estou vivendo só por esse instante como costuma dizer meu amigo Chemale. Vejam que não citei vontades e falta de drogas. É que realmente não penso mais nisso, escolhi no dia 13 de maio viver sem isso e é gratificante saber que a felicidade não está nas fugas, mas no enfrentamento dos problemas com serenidade e gratidão.
Tenho a certeza que quando Deus se aproximou de mim e me tocou, não me deu garantia que eu não teria problemas, mas certamente me deu armas ou ferramentas para enfrentar. E é assim que vivo fazendo o bem conforme os desígnios de Deus, feliz e grato por, Só Por Hoje, estar em plena felicidade por ter me libertado das correntes da adicção. Mas, preciso sempre lembrar que venço novamente só hoje, o amanhã não me pertence e o passado já passou. Por isso sou grato todos os amanheceres em que ganho um PRESENTE de Deus.
IMPORTANTE
Este é um dos muitos textos sobre recuperação da dependência química e do álcool que escrevi durante os 20 anos de minha caminhada rumo a sonhada sobriedade. Não sei se alcançarei, sobriedade é muito mais que parar com o uso do álcool e das drogas, mas estou no caminho certo. O projeto é um livro, ele vai sair, se possível, lançado na Feira do Livro de Canoas ainda este ano.
Por enquanto, todos os domingos irei colocar um dos textos em nosso site, se ajudar alguém que estiver procurando ajuda, já estarei gratificado.
BOM DOMINGO PARA TODOS!