A Teimosia da Primavera Tardia, escrever sobre coisa nenhuma

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Minha crônica de hoje, em Gotham City, se passa em um ambiente (café), que funciona como um refúgio harmonioso e irônico, contrastando com o caos lá fora. Temos de tudo em Gotham, os buracos nas ruas, a saúde que insiste em agonizar e ficar em estado terminal, mas o pior é a ironia dos protestos com bandeiras políticas, é no caos que eles aparecem, são alimentados por ele.

Essa ironia de protestar por Bandeira Política, todos, assim como eu, estão mais preocupados em não manchar um café latte. Alguns estão mais em limpar o palco do debate (asfalto) do em cuidar da estrutura social básica (a cidade por inteiro).

Já Qualquer Quente, chegou à conclusão que escrever sobre o nada é a maneira mais fiel de descrever uma realidade que só valoriza o superficial, o bom e enganador “espetáculo político”.

Meu “desabafe” se faz necessário, ops… derrubei o café em minha camisa branca da Lewis, ele mostra a superficialidade do debate político em Gotham. Então vou começar a escrever sobre “coisa nenhuma”, assim mantenho a crítica latente.

O “coisa nenhuma” pode ser o ponto de resistência para enxergar a cidade através da vitrine de meu café. É o transporte que passa, a velho que tropeça e cai nos buracos do centro, entre outros problemas.

É o dilema do cronista do Clarim Diário, sobre como você pode escrever sobre “coisa nenhuma” (o que é subjetivo, muitas vezes o não-político) em uma cidade onde os problemas são evidentes e os protestos focam no político.

Sigo com meu ato de tomar um café, de observar a luz em um beco, de me perder em um pensamento banal, pode ser um pequeno ato de resistência em um ambiente sufocante. Meu verdadeiro desejo, além de “coisa nenhuma”, é escrever sobre a necessidade de encontrar beleza ou pausa no meio do caos.

Quero falar do Pão de Queijo com parmesão (maravilhoso), da quietude momentânea do café, mas sou interrompido por um barulho abafado de um megafone de protesto. Presentemente, meu café vira um santuário.

Mas o café é reflexivo, ele me chama a “não preocupação”, o que chamo de “coisa nenhuma” pode ser o contraste que expõe a polarização. Penso nas pessoas que não protestam, que seguem suas vidas, e como essa “normalidade” coexistem com a urgência.

E vem uma pergunta:

O silêncio delas, ou a futilidade delas, diz algo sobre o estado da cidade?

Fico pensando no drama pessoal de cada indivíduo que é impactado pela política, mas que está preocupado com algo aparentemente menor (um coração partido, uma conta para pagar, um sonho simples). Ele não percebe que sua vida privada é, por si só, afetada pelo contexto político/social de Gotham.

Não vou deixar as preocupações com Gotham permeiem meu café, os protestos devem ser o som ambiente, a nuvem de poeira e a linha de ônibus desviada são “coisas” do cotidiano. Vou evitar falar sobre a política, vou escrever sobre “coisa nenhuma”, e de como é moldada a vida cotidiana.

Gotham pode estar em um estado de absurdo, vejo pelas manchas de tinta spray no muro do café, são os protestos ou politicagem?

Ontem falei com os cones laranja, com a poça de água que a Corsan deixa verter pelas vias da Village, com o poste de luz sem luz. Eles são testemunhas silenciosas de tudo. Mostram a falta de preocupação com a coisa pública e de protestos vazios.

Quero lembrar, que escrever sobre “coisa nenhuma” não significa ignorar o “tudo”. Apena estou usando o “nada” como um espelho distorcido, um refúgio necessário ou um contraponto irônico para revelar a complexidade e a tensão de Gotham City.

Minha “fútil” escrita, de hoje, tem um poder silencioso de humanizar um contexto que a política tenta reduzir a slogans.

Vou terminar meu café, enquanto o cachorro “latte” lá fora.

 

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